domingo, 6 de junho de 2010

Cineclubes do Rio contam com atrações que vão além dos filmes

Por: Annaclara Velasco 06/06/2010
Projeções cinematográficas fora do circuito comercial se juntam a rodas de choro, degustação de cachaça, debates e até festas para atrair todo tipo de público. Confira aqui
Hoje, no Brasil, existem cerca de 600 cineclubes, dos quais 80 funcionam no Rio de Janeiro, de acordo com o Conselho Nacional de Cineclubes Brasileiros (CNC) - entidade sem fins lucrativos que representa 400 cineclubes filiados no Brasil. Cada cineclube tem sua especificidade, mas o objetivo é comum: levar ao público produções cinematográficas de qualidade, que não tenham características comerciais e que não encontram espaço para exibição nas grandes salas, a preços acessíveis.
“A principal característica do cineclube é que sua existência permeia praticamente todo o tecido social. Tal afirmativa fica clara quando se constata a existência de cineclubes ligados a associações de moradores de bairros periféricos e até de universidades. Qualquer grupo de pessoas pode abrir um cineclube. Os direitos de exibição não-comercial dos filmes são distribuídos através de algumas instituições ou pelos próprios produtores”, explica o secretário-geral do CNC, João Baptista Pimentel.
Segundo Pimentel, os cineclubes não têm um “dono”, pois a responsabilidade por seu funcionamento deve ser coletiva e assumida pela diretoria da instituição e seus sócios. A grande maioria dos cineclubes não cobra entrada, mas isto não é uma condição para o funcionamento. Caso ache necessário, pode ser cobrada uma pequena taxa de manutenção.
É o caso de um dos cineclubes mais famosos e “bombados” do Rio de Janeiro, o Cachaça Cineclube, formado por ex-estudantes de cinema da Universidade Federal Fluminense, que cobra R$ 12 por sessão e acontece uma vez por mês.
Segundo a cineasta e uma das idealizadoras do Cachaça Cineclube, Débora Butruce, os cineclubes tiveram seu auge nos anos 60 e 70, mas saíram um pouco de cena por causa da crescente censura. O ressurgimento aconteceu por volta da primeira década do ano 2000, com a participação dos estudantes de Cinema, que buscavam um lugar para apresentar suas produções.
Foi nesta época, no ano de 2002, que Débora se juntou com seus colegas de curso Karen Barros e João Mors para realizar o projeto Cachaça Cineclube. Eles queriam encontrar um lugar privilegiado para exibir o curta “Bichos Urbanos”, feito por Karen e João. Conseguiram negociar um espaço de exibição: o Cinema Odeon, na Cinelândia, Centro do Rio. Fizeram uma proposta de ocupação que foi bem recebida pela organização do cinema e usam o espaço até hoje. O formato de cineclube mais degustação de cachaça, além de uma festa, foi uma forma de fugir do tradicional.
“A maioria dos cineclubes apresenta o filme e organiza um debate depois. Mas achamos que quando uma discussão é imposta, ela não flui. Dessa forma, queremos oferecer um ambiente descontraído para estimular a discussão natural sobre o filme”, explica Débora.
Ao som de um DJ e ao sabor da degustação da cachaça Claudionor, o papo flui com maior descontração.
“A festa acaba às 2 horas da madrugada impreterivelmente. Não queremos que vire um programa da noite, uma festa apenas. Muitas pessoas têm interesses superficiais, mas o nosso intuito principal é a exibição dos filmes. Tanto que a bilheteria só funciona para a compra do ingresso do filme. Depois que a sessão começa, a bilheteria fecha”, esclarece Débora.
Em Niterói, o grande problema é a escassez de salas

Em Niterói, já há alguns anos, cinema é cultura em extinção. Só para lembrar de fatos tristes recentes, houve o fechamento do Cine Icaraí, Cine Center, do Estação, das cinco salas do ItaipuMulticenter, de parte das salas do Cinemark Plaza Shopping, que depois de um incêndio no final de 2009, até hoje mantém parte delas fechada. Até os cineclubes sofreram com o abre e fecha das salas de cinema. Dois deles, o Cineclube Sala Escura e o Nictheroy Cineclube, estão com suas atividades suspensas por conta do fechamento do Cine Art UFF, que está passando por um período de reforma. Apesar deste desfalque, o cineclube é uma alternativa cultural na cidade, que mantém seu público cativo.
O CineOlho usa um espaço nobre – o Museu de Arte Contemporânea de Niterói – há três anos para fazer sessões mensais. A cada mês é estabelecido um tema. O jornalista Aurélio Brandt e o produtor Leandro Batista selecionam filmes – na maioria das vezes curtas-metragens, mas esta não é uma regra – que tenham a ver com a temática.
A proposta de utilização do espaço – o auditório, que normalmente é usado para a realização de palestras – foi aceita pela direção do museu, que cedeu o espaço em uma parceria cultural.
“O cineclube é muito importante por dar espaço aos filmes que não teriam nenhum outro lugar para serem exibidos. Exploramos temas diferentes e esse retorno, esse diálogo, só acontece dentro deste ambiente”, afirma Marco Aurélio.
A Associação dos Professores Inativos da UFF também promove sessões mensais e gratuitas do Cineclube ASPI. Apesar de ser aberto, o público não varia muito, sendo composto basicamente por ex-professores e funcionários da universidade. Recentemente, a sala de exibição passou por uma reforma, mas as sessões não foram suspensas: aconteceram em uma sala improvisada, para não deixar de atender ao público.
A organizadora, Neusa Pinto, escolhe e exibe os filmes e afirma ter muito carinho pelo projeto, que tem três anos.
“Nosso público é pequeno, mas é um público cativo, que valoriza este evento. Procuro escolher filmes que signifiquem alguma coisa para os nossos espectadores, mas estou sempre aberta a palpites. É um espaço bem democrático”, diz.
Os comentários ficam por conta da interação dos espectadores depois do filme, quando é servido um cafezinho. Mas, esporadicamente, um professor da UFF é convidado para discutir o filme.
Legalização pode garantir patrocínios através da participação em editais e convênios

Para institucionalizar um cineclube é preciso fundar uma entidade cultural sem fins lucrativos, eleger sua diretoria, registrá-la no Cartório de Títulos e Documentos, inscrever-se na Receita Federal e na Agência Nacional do Cinema (Ancine). Mas o funcionamento de um cineclube pode acontecer por uma simples decisão coletiva. A legalização apenas permite a participação em editais, convênios e recebimentos de doações.
Algumas iniciativas estão surgindo com o objetivo de incentivar o movimento cineclubista no Brasil. Uma delas é o Cine Mais Cultura, do Ministério da Cultura. Seu objetivo é ampliar a rede de exibição brasileira, por meio de iniciativas não comerciais, entregando equipamento completo de projeção, conteúdo audiovisual em DVD de filmes nacionais (cedido pela Programadora Brasil) e levando oficinas de capacitação cineclubista (coordenadas pelo CNC).
Segundo Frederico Cardoso, coordenador executivo do projeto, o objetivo é capacitar os gestores dos cinemas, que podem ou não se tornar cineclubistas.
“Estamos juntos com este movimento por meio da parceria com o CNC. É interessante levar a prática do cineclube para estes locais, já que é o único modelo não comercial de exibição constante capaz de organizar e integrar mais iniciativas não comerciais ao circuito. Os cineclubes criam relações interpessoais. Desde o realizador, passando pela equipe do cineclube e chegando até o público, envolvendo a todos. Nunca se estabelecem relações frias e isso une a sociedade”, explica.
Um giro pelos cineclubes

Beco do Rato – Acontece todas as quintas-feiras. A sessão começa às 23h30, mas antes tem uma roda de choro com o grupo Recita de Choro, às 20h. O Beco do Rato fica na Rua Morais e Vale, Lapa. A entrada é gratuita.
Cineclube Aspi – Sessões mensais na Associação de Professores Inativos da UFF, que fica na Rua Passo da Pátria 19, em São Domingos. A entrada é franca.
Cachaça Cineclube – Além de privilegiar curtas-metragens brasileiros, após as sessões promove-se degustação de cachaça e festa com DJs. Acontece, normalmente, na segunda quarta-feira do mês, no cinema Odeon, na Cinelândia. A entrada custa R$ 12.
Cineclube LGBT – Acontece toda última sexta-feira do mês, no cinema Odeon, na Cinelândia. Os filmes são destinados ao público gay e após a exibição acontece uma festa. A entrada custa R$ 12.
Cine Olho – As sessões acontecem mensalmente no MAC, na Boa Viagem, normalmente no último sábado. A entrada é franca.
Cineclube da Escola de Cinema Darcy Ribeiro – Todos os sábados, às 18h. A lista de filmes exibidos é escolhida pelo professor Walter Lima Júnior, e, ao final da sessão, o professor promove um debate. Rua da Alfândega, 5, no Centro do Rio, e a entrada é gratuita.
Cinemaison – As exibições dos clássicos franceses acontecem sempre às segundas-feiras, duas vezes ao mês. A entrada é gratuita, mas para entrar é preciso solicitar o seu cartão de sócio através do formulário de cadastro no site www.cinefrance.com.br. Acontece na Embaixada da França, Avenida Presidente Antonio Carlos, 58, 6° andar, Centro do Rio.
Fonte: http://jornal.ofluminense.com.br/editorias/o-flu-revista/cineclube-e-uma-%E2%80%98cachaca%E2%80%99
O Fluminense

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